O dilema do escuteiro



ESTAS FOTOS, tiradas há um par de dias numa povoação algarvia (onde esta situação é a regra e não a excepção - não havendo, sequer, a desculpa de que "é só no Verão"), não teriam, por si só, nada de novo se não se desse um facto insólito:

Nessa terra (e tanto quanto foi possível apurar falando com bastante gente), parece existir uma perfeita identidade de interesses e entre prejudicadores e prejudicados que faz com que a situação, além de não chocar ninguém, satisfaça a todos - peões, automobilistas, comerciantes, autarcas e autoridades!

Fica, pois, a questão: valerá a pena, em casos destes, gastar tempo, pachorra, bits e autocolantes a defender peões que não querem ser defendidos - como na história do escuteiro que quer obrigar a velhinha a atravessar a rua, mesmo contra a vontade dela?

10 comentários:

  1. Mesmo numa comunidade com taxas de motorização muito altas como Lagos, Oeiras ou Loures metade das pessoas não são proprietários de um carro (aproximadamente 500 carros por cada 1,000 pessoas).

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  2. Mesmo que se trate de uma terra em que a maioria das pessoas não tenha (ou não ande de) carro, pode haver um estado de espírito generalizado que aceite esta situação como normal.
    O exemplo de Vila Velha de Ródão, há dias aqui colocado, é um caso desses.

    Basta, aliás, que "tenha sido sempre assim" para que ninguém se revolte - seja qual for a situação que esteja a ser analisada.

    Quando as autoridades, por sua vez, não fazem a sua parte, a situação eterniza-se.

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  3. Se, numa terra, esse comportamento é generalizado, acaba por apenas ser anti-social para quem vê (ou vem) de fora.
    Para quem lá mora, é normal - e de tal forma aceitável, que nem sequer colocam o problema.

    Estão num estado civilizacional equivalente aos que aceitam que se urine no meio da rua.

    Há que ter paciência, pois essas coisas levam tempo...

    Ed

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  4. O comportamento incívico que se vê em muitas zonas urbanas (e que este blogue se esforça por combater) é uma imagem, precisamente, desse comportamento "labrego".

    Mas não nos admiremos da aceitação que, em certos casos, ele tem. Veja-se como, frequentemente, os turistas aderem rápida e entusiasticamente ao estacionamento-selvagem - fazendo em Portugal o que jamais sonhariam fazer na sua terra!

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  5. Digam-me que terra é, para eu não pôr lá os pés.

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  6. Os passeios desta povoação não são propriedade dos que lá moram. Qualquer cidadão, de qualquer ponto do país, tem direito a andar sobre eles. A argumentação apresentada é portanto falaciosa. Já agora: não há invisuais, pessoas com deficiências físicas ou em geral com mobilidade condicionada, neste sítio? Se sim, estes também foram consultados?

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  7. Se o PG conhecesse, como eu, a terra em questão (e falasse com as pessoas que lá moram), saberia que, na esmagadora maioria, se mostram completamente alheias ao problema dos passeios ocupados.

    O assunto, pura e simplesmente, não lhes interessa! Parecem todas satisfeitíssimas com o caos ali reinante, tanto mais que não faltam lugares de estacionamento gratuito por todo o lado, que não usam.

    No meio dessa selva urbana, a polícia não mexe uma palha, os autarcas são sucessivamente reeleitos com grandes maiorias, e ninguém protesta.

    Quanto aos invisuais, pessoas com carrinhos de bebés, paraplégicos, etc: quando não podem usar os passeios, andam nas faixas de rodagem como se fosse a coisa mais natural do mundo!

    É estúpido, é revoltante... mas é a dura realidade. Assim sendo, têm o que querem e merecem - e bom proveito lhes faça.

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  8. As pessoas com carrinhos de bebés e mesmo deficientes motores são os primeiros a colocar o carro em cima do passeio, por isso a m**** é generalizada.
    Quem se lixa são aqueles (poucos) que não concordam com isso.

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  9. O texto, que termina com uma saudável provocação, pretende mostrar uma realidade que não vale a pena escamotear:

    Da mesma forma que os habitantes de algumas autarquias se preparam para eleger quem os andou a roubar (sabendo isso), também nestes casos os habitantes protegem os infractores. Se alguém (mesmo peão) visse a PSP a multar estes carros, virar-se-ia contra a polícia.
    Quem conhece a terra onde as fotos foram tiradas, sabe bem que é assim.

    Porquê?

    O que sucede é que, da mesma forma que no interior de África muitos povos passaram da Idade da Pedra para a dos telemóveis (sem percorrerem o caminho civilizacional intermédio), também as gentes destas terrinhas passaram, quase sem transição, das carroças para os jipes.

    Todo o processo de evolução cultural (que envolve coisas como "direitos dos peões") - pura e simplesmente - não existiu.

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  10. Depois há um outro factor que ainda aqui não foi referido: por muito que as pessoas barafustem contra os carros sobre o passeio, a verdade é que no fundo, todos pensam que mais cedo ou mais tarde, farão o mesmo, assim que surgir a oportunidade! Daí, esta conivência com o prevaricador!
    Tenho perto de casa, uma esplanada mesmo ao lado de um parque de estacionamento onde todos os dias assistimos a carros a bloquear a entrada do parque ou mesmo a se bloquearem uns aos outros. O curioso é que nos poucos casos em que a polícia se digna em aparecer, conta sempre com a oposição dos presentes. É inacreditável mas a maioria das pessoas que frequentam aquela esplanada, estão quase sempre do lado do prevaricador e prontas a defendê-lo.
    Isto só pode ter uma explicação: é que todos eles já fizeram o mesmo ou acham normal fazê-lo. Se ainda não o fizeram, não querem entrar em conflito com os prevaricadores, por pensarem que amanhã poderão estar na mesma situação e não quererão que alguém lhes aponte o dedo.
    Esta é uma das principais razões pela qual a bandalhice do estacionamento abusivo sobre passeios, passadeiras ou bloqueando outras viaturas, continuará a afligir-nos. O mal está enraizado na nossa mentalidade e enquanto essa não mudar...!!!

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