Crónica no Diário Económico

Passeios
31/03/09 00:01 | João Paulo Guerra 

Em Portugal, país de cerca de 10 milhões de umbigos, acaba de ser constituído um movimento cívico.
Actividade rara. O movimento destina-se a protestar contra o estacionamento abusivo que interfere com direitos da maior parte da população da cidade de Lisboa, o de circular a pé em áreas que lhe são destinadas e que foram tomadas de assalto para estacionamento de automóveis. O protesto traduz-se na afixação de um autocolante nos veículos estacionados em áreas destinadas à circulação de peões.
Um jornal que dava conta da criação do movimento dizia que a acção "não reúne consenso". Na verdade, o labroste que atropela os direitos dos outros não concorda que lhe chamem a atenção para a selvajaria, menos ainda quando a chamada de atenção se reveste de uma forma que de algum modo atinge, nem que seja com a simples cola de autocolante, a extensão do "ego" que é o "popó".
Em muito poucas cidades da Europa é possível assistir às manifestações de barbárie que podem ver-se em Lisboa, e em geral em Portugal, nesta matéria. O ‘blog' do movimento em apreço (http://passeiolivre.blogspot.com) ilustra bem que a realidade vai muito para além da imaginação mais delirante. No comum das cidades civilizadas, para que os automóveis não estacionem em cima dos direitos dos peões não é necessário qualquer dispositivo ou ameaça: basta o civismo. Mas, por cá, o civismo morreu atropelado na passadeira. De maneira que "não há consenso". E resta ver que partido tomam, quando for o caso, os que deviam assegurar o direito ao passeio livre. Aposto que vão comentar que sim senhor, que os peões têm os seus direitos, mas que há outras formas de fazer respeitar a lei. Quando sob a sua tutela o que está em vigor é a lei da selva.

5 comentários:

  1. Grande texto. É importante ler coisas assim.

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  2. Para muitos o "popó" não é apenas a extensão do ego, é a namorada que não têm, o verdadeiro filho, a esposa de quatro rodas e para grande parte dos que andam a acelerar por aí, a potência que lhes falta na cama.

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  3. Nota: João Paulo Guerra é autor-convidado do "Sorumbático", onde esta crónica também está afixada. (http://sorumbatico.blogspot.com/2009/03/passeios.html)

    Quer isso dizer que eventuais comentários que lá sejam feitos são-lhe reencaminhados.

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  4. Concordo plenamente com o movimento e dou-lhes os parabens pela coragem.
    Curiosamente isto é uma situação que se vê mais em Lisboa do que em outras cidades do país. Serão os lisboetas menos civilizados(?)

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  5. Não acho que sejam os lisboetas a serem incivilizados. Não se esqueça que a maioria dos carros estacionados em Lisboa durante a semana vêm de fora.

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